16 de setembro de 2010

O ORGULHO DO REI NABUCODONOSOR


Moeda com a face de Nabucodonossor.

DANIEL 4:
19 Então Daniel, cujo nome era Beltessazar, esteve atónito por algum tempo, e os seus pensamentos o perturbaram. Falou, pois, o rei e disse: Beltessazar, não te espante o sonho, nem a sua interpretação. Respondeu Beltessazar, e disse: Senhor meu, seja o sonho para os que te odeiam, e a sua interpretação para os teus inimigos:
20 A árvore que viste, que cresceu, e se fez forte, cuja altura chegava até o céu, e que era vista por toda a terra;
21 cujas folhas eram formosas, e o seu fruto abundante, e em que para todos havia sustento, debaixo da qual os animais do campo achavam sombra, e em cujos ramos habitavam as aves do céu;
22 és ,tu, ó rei, que cresceste, e te fizeste forte; pois a tua grandeza cresceu, e chegou até o céu, e o teu domínio até a extremidade da terra.
23 E quanto ao que viu o rei, um vigia, um santo, que descia do céu, e que dizia: Cortai a árvore, e destruí-a; contudo deixai na terra o tronco com as suas raízes, numa cinta de ferro e de bronze, no meio da tenra relva do campo; e seja molhado do orvalho do céu, e seja a sua porção com os animais do campo, até que passem sobre ele sete tempos;
24 esta é a interpretação, ó rei é o decreto do Altíssimo, que é vindo sobre o rei, meu senhor:
25 serás expulso do meio dos homens, e a tua morada será com os animais do campo, e te farão comer erva como os bois, e serás molhado do orvalho do céu, e passar-se-ão sete tempos por cima de ti; até que conheças que o Altíssimo tem domínio sobre o reino dos homens, e o dá a quem quer.
26 E quanto ao que foi dito, que deixassem o tronco com as raízes da árvore, o teu reino voltará para ti, depois que tiveres conhecido que o céu reina.
27 Portanto, ó rei, aceita o meu conselho, e põe fim aos teus pecados, praticando a justiça, e às tuas iniquidades, usando de misericórdia com os pobres, se, porventura, se prolongar a tua tranquilidade.
Na continuidade da explicação do sonho e do seu cumprimento:
DANIEL 4:
28 Tudo isso veio sobre o rei Nabucodonozor.
29 Ao cabo de doze meses, quando passeava sobre o palácio real de Babilónia,
30 falou o rei, e disse: Não é esta a grande Babilónia que eu edifiquei para a morada real, pela força do meu poder, e para a glória da minha majestade?
31 Ainda estava a palavra na boca do rei, quando caiu uma voz do céu: A ti se diz, ó rei Nabucodonozor: Passou de ti o reino.
32 E serás expulso do meio dos homens, e a tua morada será com os animais do campo; far-te-ão comer erva como os bois, e passar-se-ão sete tempos sobre ti, até que conheças que o Altíssimo tem domínio sobre o reino dos homens, e o dá a quem quer.
33 Na mesma hora a palavra se cumpriu sobre Nabucodonozor, e foi expulso do meio dos homens, e comia erva como os bois, e o seu corpo foi molhado do orvalho do céu, até que lhe cresceu o cabelo como as penas da águia, e as suas unhas como as das aves.
Sonho narrado por Daniel, que começou a falar no v.19. nos dois casos o rei não abriu a boca. No primeiro caso, porque a explicação é dada por alguém que não é o próprio rei; no segundo caso, porque já não se encontra em condições de falar. O silêncio faz parte do cumprimento da profecia. O texto está escrito na terceira pessoa do singular, o que implica o estado patológico do rei e o leva a este mutismo, realçando por esse facto a realidade objectiva do acontecimento. Não é Nabucodonosor que fala mas uma testemunha.
O cumprimento é colocado no tempo e no espaço como para sublinhar o carácter histórico. Por outro lado, situa-se no mesmo tempo e no mesmo espaço do próprio sonho, um ano depois, o que quer dizer no aniversário do sonho, e no espaço, ou seja, no palácio real. Esta concordância é uma maneira de lembrar o sonho de então e de sublinhar o seu cumprimento sem agravo.
A Porta de Ishtar no Museu Pergamon
Como sempre o rei mantém a serenidade, uma felicidade inconsciente. Ele passeia-se e desfruta da paisagem que rodeia o seu palácio (vv.29,39). Mas desta vez os sentimentos do rei são expressados. Ele fala, e o seu orgulho desmesurado é traído pela forma como se exprime (ver Daniel 4:30).
Esta declaração do rei não é uma simples gabarolice, uma mera jactância. Nabucodonosor distinguiu-se na história como o maior construtor de Babilónia. Nisto ele difere dos seus predecessores que se dedicaram mais às conquistas a habitar uma cidade, eles só vinham a Babilónia por altura das festas e celebrações do novo ano. Para Nabucodonosor, Babilónia era a única cidade digna dele, de ser a cidade real, “a cidade do seu orgulho” (Records of the Past, New Series, Londres, 1888-92, S. Birch ed., p.71). E por este facto, Babilónia devia-lhe as mais sumptuosas maravilhas que já foram colocadas numa cidade na Terra.
Tendo cinco quilómetros quadrados, com os seus palácios, os seus jardins suspensos e os seus cinquenta templos, Babilónia era classificada como uma das sete maravilhas do mundo e uma das maiores cidades da época.
Segundo um testemunho de um sacerdote babilónico de Bérose e das antigas inscrições cuneiformes, foi especialmente Nabucodonosor que foi o arquitecto desta cidade. Além dos numerosos templos e das muralhas exteriores, o rei mandou construir o seu próprio palácio que era na sua opinião “digno da majestade do rei” (A. Champdor, Babylone e Mésopomie, Paris, 1953, pp. 120 ss.). Os jardins suspensos eram igualmente obra do rei e tinham como objectivo de lembrar a sua esposa Amytitis as árvores e as flores da sua Média natal. A beleza grandiosa destes lugares impressionava os estrangeiros e particularmente os poetas. Entre as mais antigas lendas era lembrada a maravilhosa história de Sémiramis, fundadora de Babilónia, esta rainha Assíria de quem se dizia os amores e a glória inspiraram uma das tragédias de Voltaire e uma ópera a Rossini.
É sem duvida o orgulho que leva Nabucodonosor a uma tal consecução. É ainda o orgulho que o fazia vibrar ao contemplar a sua obra. Não só a Bíblia, mas a maior parte das inscrições cuneiformes, mais de cinquenta, assinadas por Nabucodonosor testemunham a sua mentalidade excêntrica. A propósito do palácio escreve ele:
”Eu construi o palácio, sede da minha realeza
Construído por povos fortes
Lugar de alegria e prazeres (...)
Eu reconstrui Babilónia,
Sobre um abismo antigo (...)
Com argamassa e tijolos
Eu coloquei as suas fundações.”
(Cilindro de Grotefend, KB III, 2, p.39)

Ou ainda e a propósito da cidade de Babilónia:
“Eu fiz Babilónia a santa cidade.
A glória dos grandes deuses, acima de tudo o que tinha sido feito até então.
Nenhum rei (...) ninguém criou, nenhum rei entre todos os outros reis, ninguém construiu uma tal magnificência para Marduque (...)
Que o meu nome seja proclamado para sempre.”
(Tablete, Museu de Berlim)

De facto o orgulho do rei foi predito pelo profeta. Assim o sonho dado ao rei sob a forma de uma arvore que se eleva para o céu, e que pretende a divindade.
De uma maneira significativa o texto de Daniel lembra de novo o relato da torre de Babel. Como os antigos construtores, Nabucodonosor construiu para a sua própria glória e para perpetuar o seu nome; como eles, ele eleva-se na direcção do céu (para fugir do Céu), ver (Génesis 11:4). Como eles enfim, a sua palavra orgulhosa é interrompida por uma voz que desce do Céu (Génesis 11:7). Como foi com eles, ele é expulso, e a sua palavra perde-se na confusão do mugido (Génesis 11:8).

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